16 de outubro de 2010

Sobre a vaidade

.    Segundo Samuel Johnson, nós, seres humanos, precisamos de pouco dinheiro pra manter o nosso sustento biológico. Três libras esterlinas por ano seriam suficientes para este intento, dizia o pensador inglês. Essa quantia nos permitiria "encher a pança, obter proteção contra as intempéries do clima, e até mesmo a compra de um casaco resistente, desde que feito de um bom couro de boi."
.    Nessa mesma linha de pensamento, tudo que vá além dessas necessidades é supérfluo e artificial.  Sabemos que os seres humanos possuem outras necessidades que transcendem a esfera material, como a necessidade de auto-realização, de amar e ser amado, de trabalhar, errar e aprender, de criar e se desenvolver. Johnson, no entanto, conclui que tudo que é desejado além da manutenção da sobrevivência é desejado com o intuito de obter um maior grau de respeito perante a sociedade. Há um certo grau de veracidade nessa última afirmação.
.    Quantas vezes fazemos algo para obter a aprovação de terceiros? Ou melhor, quantas vezes nos esforçamos mais pela necessidade de superar os outros do que para desfrutar as benesses do nosso trabalho? Isso significa que boa parte dos nossos esforços para estudar, cuidar do corpo, cuidar da mente, ter dinheiro ou comprar o carro do ano vem mais da necessidade de obter atenção e respeito do que da necessidade de usá-los. Caso contrário, um novo carro só seria comprado quando já não tivesse mais em condições adequadas de uso. Na nossa sociedade, carro do ano (aliás, nem todos) é sinal de status e possuir status alimenta a vaidade. E é aí que está uma das forças que induzem o homem ao trabalho e a superação:a vaidade.
.    A vaidade faz com que queiramos ser ou pelo menos parecer melhores do que realmente somos, pois essa suposta superioridade traz consigo uma falsa sensação de segurança e bem-estar. Adam Smith dizia que ser notado, ser ouvido, ser tratado com simpatia e afabilidade e ser visto com aprovação são todas as vantagens de quem possui destaque em algum aspecto da vida, seja na área profissional, estética, intelectual, financeira, política ou qualquer que seja. Por isso, esse sentimento é imbuído da ideia de que se obtendo sucesso seremos objetos permanentes de atenção e aprovação. E é essa sensação de admiração sobre si que mais apraz o vaidoso. 
.    Certa vez, um professor afirmou que as coisas que mais causam prazer ao homem é a admiração das mulheres e o respeito dos outros homens. Admiração para o vaidoso é a palavra-chave, mesmo que essa admiração provenha de valores ilusórios ou transitórios como a beleza, status, dinheiro, força e poder. Daí decorre o pior sofrimento do vaidoso: tentar convencer os outros de ser uma coisa que não é ou que se é por pouco tempo. A beleza se modifica com o tempo. Dinheiro, força e poder transitam pelas mãos das pessoas como o tempo escorre pela vida. E o status depende do ponto de vista pelo qual se observa. Daí a melhor definição que já ouvi para essa palavra: "status é querer ser uma coisa que não somos para agradar pessoas que não gostam de nós".
.    Talvez a melhor postura diante da vaidade seja a adotada pela poetisa da transitoriedade Cecília Meireles:
"Em toda a vida, nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou o sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha personalidade."
.    Difícil é pensar e agir assim.

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